“Aventura” em 4 canais…

Pedrinho Batera PageOlá galera… Sempre pensando nos nossos “papos” virtuais, acredito que uma ordem cronológica dos textos por aqui seja interessante, pois teremos muito tempo e espaço pra isso… Seguindo esse princípio, quero dividir com todos uma “aventura” muito legal lá do começo…

Bem no final dos anos 70/início dos anos 80 no estúdio Vice-Versa, quando o Pro Tools estava mais perto do seriado “The Jetsons” do que das nossas mãos, o Fernando Telji, que era produtor do estúdio na época me disse: vamos produzir um disco com o Pedrinho Batera (Som Nosso de Cada Dia)… No estúdio B!!! Aeeeeeeeeeee…!!! No B???!!! Fiquei apavorado! Como gravaria o Pedrinho no B, sabendo que vinha chumbo do grosso na arregimentação? Na época, o B do Vice-Versa tinha uma mesa Teac 16 X 4 (turbinada pelos equalizadores gráficos fabricados na sala dos milagres do “magic” Joaquim Gonçalves), uma Ampex AG 440 de 4 canais, monitores JBL não me lembro o modelo, alguns bons microfones e um técnico demente em início de carreira que topou essa empreitada!!! Hahahaha…

Bom, o primeiro passo foi roubar a bateria do estúdio A, uma Pearl Wood Fiber zero, na caixa (como gravamos no período da madrugada ficou mais fácil driblar a diretoria… Me perdoem, confessei o delito depois de 30 anos!!!), pra garantir o som da cozinha. Aliás, cansei de esticar cabos de microfone, fones e gravar o piano acústico do estúdio A nas produções do B, roubar as caixas de bateria do Wilsão Gonçalves, entre outros pequenos “delitos” técnicos, etc… Afinal, a concorrência era desleal com as gravinas do Vinicão, do próprio Wilson, e de outros Top Guns da época de ouro do Vice-Versa… Bom, voltando ao assunto de pauta, a arregimentação desse disco era “apenas” Nico Assumpção e Zé Português nos baixos, Egídio Conde e Ivo Carvalho nas guitarras, Ricardo Cristaldi nos teclados e arranjos, Bocato e a galera toda da Metalurgia nos metais, Caio Flávio, Marcinha e cia nos vocais, participação do Pedrão Baldanza, e o Pedrinho na bateria, percussão e vocal solo, é claro.

Com a competência e calibre de todos os envolvidos do lado de lá do aquário, gravamos todas as bases mixadas direto em dois canais e todos os complementos nos outros dois restantes da velha e cúmplice Ampex AG 440. Feito isso, o próximo passo foi mixar tudo para o tape de ¼ num Revox A700 (com o auxílio luxuoso da salinha de azulejos no teto do estúdio como reverb top de linha, a Orban azulzinha que eu não lembro o modelo e dois clássicos compressores LA3) e devolver as mixes para a máquina multitrack (usei muito esse procedimento de gravar bases já mixadas em poucos canais, quando as nossas bravas e valentes máquinas de 24 tracks começaram a ficar insuficientes e eu queria aproveitar o som analógico, principalmente quando elas eram equipadas com Dolby SR, gravando em 15 ips).

Nessa etapa do trabalho tínhamos fantásticos instrumentais gravados em dois canais; bases suficientemente boas para as tomadas de voz solo e vocal nos outros dois canais disponíveis. Gravadas as vozes solo do Pedrinho e todos os vocais, tudo pronto para mixar… Mixar com apenas um detalhe: “o resto”!!! Faltava ainda o obrigatório e “balançado” toque da Metalurgia e alguns teclados e guitarras!!!

Na fase da mixagem do trabalho, colocamos todos os metais dentro do estúdio, o Ricardo Cristaldi (Mr. Fender Rhodes) com o Mini Moog e o Ivo Carvalho (Mr. Bom Gosto) com a Les Paul dentro da técnica; todos tocando real time com a mix!…Rs. Foi mais ou menos essa a insanidade para gravar o “Bananas”, “Lixo per Capta”, “Pra Swingar” e “Eu Te Quero Agora” … Na época saiu um compacto duplo pelo selo Royal (do Oswaldo Malagutti/Mosh). Aventura MEGA que eu ainda vou recuperar o áudio original, pois esse compacto desapareceu misteriosamente da minha estante!!! … Se alguém encontrar essa pérola por aí, por favor, me avise!!!

Abraço do Farat!!!

Como tudo começou (Parte 1)…

Blog

 

Tão importante quanto uma boa referência técnica lá no início da estrada, é uma boa companhia artística e criativa como base (falo muito sobre isso aos que começam a jornada nos dias de hoje, onde se olha primeiro para as maravilhas da versão nova do Pro Tools, depois pra dentro do estúdio!!!).

Depois do susto que foi ouvir “The Dark Side Of The Moon” e “A Night At The Opera” (os dois discos que radicalmente mudaram a minha vida e me direcionaram pro áudio), ter um pouco de sorte, estar no lugar certo e na hora certa, com “padrinhos e mestres” certos, foi fundamental e um empurrãozinho sem preço… As pedras fundamentais na minha jornada foram, sem dúvida nenhuma, as portas que o Maurício de Sousa e o seu irmão Márcio abriram nos estúdios MSP pra esse boy de construtora metido a besta aqui… Sou eternamente grato, porque depois de ser despedido do antigo emprego por passar a maior parte do tempo tocando Hammond na máquina de escrever e Moog na calculadora em dia de concorrência (dublando John Lord no disco, ops, na Basfita K7 46 “Come Taste The Band” do Deep Purple) no escritório da empresa, a casa caiu pra mim!!! Naquele momento acreditei que seria menos doloroso trilhar novos caminhos do que tentar explicar ao patrão, um cara extremamente gente fina, na verdade um mix de Cristopher Cross & Mike Tyson na “máquina da mosca”, o que era Deep Purple ou quem era John Lord!!!

O próximo passo depois da Turma da Mônica, foi entrar no Vice-Versa e contar todas as mentiras possíveis ao Luiz Botelho (cada um tem o “mestre Yoda” que merece, e esse é o maior deles!!!) que, graças a Deus, não acreditou em nenhuma e apenas na minha vontade de ser alguém no áudio…

Lá no Vice (em 1979), fora meus mestres Marcus Vinícius, Wilson “Relax” Gonçalves, Ricardo “Franja” Carvalheira e Nelsinho Dantas, tive também a sorte de conviver e trabalhar com dois dos meus grandes ídolos na música: Sá & Guarabyra. O que eu vi (e ouvi) sair daqueles violõezinhos, pedaços de papel e fitinhas cassete foi uma verdadeira aula de criatividade e bom gosto!!! Junto com aquela paciência toda com a minha “ansiedade de principiante” sempre vinha um toque ou outro, que me abriram muito os olhos e ouvidos muito mais rápido sobre o que era aquele mundinho do áudio e o que era fazer parte dele.

E as bandas de Sá & Guarabyra??? A Ponte Aérea (Nonato, Constant, Pedrão e Beto), Paulinho Calazans, Alaor Neves, Ruriá Duprat, Sérgio Kaffa, Pedrão (do Som Nosso), Rui Motta, entre outros… socorro!!! Era uma festa qualquer show dos caras, numa garantia absoluta que quase todos os engenheiros de som que não estivessem na estrada ou no estúdio circulariam pelo backstage. Da música de Sá & Guarabyra não preciso falar nada (cada um coloca o que desejar na sua Cdteca e azar de quem não ouve Sá & Guarabyra), mas eu gostaria de deixar explícito nessa matéria que são dois caras que eu aprendi a “amar de paixão” e vou levar isso pro resto da vida!!! Sabe aqueles amigos que quando você encontra e abraça passa um filminho muito bom das coisas???… Então… E olha que lá se vão mais de trinta anos… Thanks maninhos, e muito obrigado por tudo até aqui!!!

E a minha primeira sessão de gravação oficial no Vice-Versa então??? Foi com o Rogério Duprat… Lá estava eu, um ex-boy frente a frente com o gênio no estúdio!!! Lembro-me muito bem do frio na barriga quando chamei o Rogério pra ouvir a mix na técnica… A frase de foi essa: “Farat, nunca ouvi um som tão lindo desse estúdio B, só que eu não estou vendendo bateria moleque… Esse jingle é para uma empresa de adubos, por favor, remixe isso com mais critério para o que a peça foi feita!”… Hahaha. Imaginem ouvir isso do mago Duprat, logo na primeira sessão de mixagem!!!

Agradeço a Deus por ter padrinhos desse porte na minha vida profissional… A humildade de todos foi extremamente proporcional as suas genialidades e minha estrada não seria a mesma sem aqueles valiosos conselhos e uma infinita paciência! Quem sou eu pra falar desses caras insanos e sensacionais???!!! Ficarão eternamente nos nossos ouvidos e na minha história pessoal e profissional!!!
Foi mais ou menos, pra não dizer exatamente, isso que aconteceu lá no começo de tudo!!!… Bom, isso foi só o início… Vem muito mais histórias e personagens por aí…

Abraço e até a próxima!!!

Paulo Farat

Um brinde ao básico…

Em primeiro lugar, gostaria de agradecer o convite da Backstage para “blogar” por aqui e aos poucos dividir com todos algumas histórias do stage e seus “derivados”… É sempre interessante uma nova porta para que possamos conversar sobre esse mundinho gostoso e divertido do áudio!!!… Vamos lá…

Ok galera, estamos numa época de formadores de opinião e do “clique aqui” no caminho virtual (e muito bem-vindo) das informações… Mas o que foi feito do básico??? No final dos anos 70 e início dos 80, na sala de reuniões do Estúdio Vice-Versa, a primeira coisa que o mestre Luiz Augusto Botelho me disse foi: “Farat, existe um coisa que precisa ser respeitada, e muito nessa profissão… o ZERO!!!”… Um dia desses numa palestra/bate papo, me perguntaram qual o caminho e o que fazer para estar entre os melh… Opa!!!… Nada de “o melhor”… Não existe o melhor engenheiro, existem os melhores procedimentos… O procedimento certo é o melhor… O som já foi descoberto há milênios, não inventem moda, por favor…

Sem generalizar, é claro, hoje em dia é comum, se colocarmos nossas mesas no “zero”, modulando o pré “cheio”, com as nossas mixes utilizando todo o potencial da mesa, provocarmos o estouro da boiada em um show de feira ou quebrarmos os vidros de dois quarteirões ao redor do espaço, por exemplo, pois o processador do PA vai estar em “+ 40 db” na entrada, ou “+ 20” no sub, e coisa parecida… rs! Por favor, vamos respeitar o “zero”… Quantas vezes eu perguntei como estava um processador que eu não conseguir acessar, e que resposta foi: “o botão de entrada ta em 3 horas!!!”… Como assim, o botão está em 3 horas???… E a leitura da entrada??? Hahahahaha… O fantasma da estrutura de ganho anda vagando por aí ainda, por mais que não pareça!!!

Exemplos como esses geram a perguntinha óbvia: “O que foi feito do básico???” Microfonação, alinhamento, energia adequada… Um certo dia o “cara” do gerador quase saiu correndo atrás de mim com um caibro porque eu pedi o meu com abacaxi e três pedrinhas de gelo!!!… Juro que era uma máquina de garapa o que eu estava vendo!!!… Nós não “fazemos” som pra ninguém… Nós transportamos o conteúdo artístico e a capacidade de execução musical para os ouvidos das pessoas, usando com o maior discernimento possível as ferramentas disponíveis… Os toques pessoais nos efeitos, processamentos de dinâmica, etc é que vão dar a “assinatura” de cada um no resultado final… E só!!!

A frase “o microfone é o primeiro que ouve” é espetacular e explícita!!!… O nosso velho e fiel companheiro microfone!!!… Que sofrimento esse cara tem passado ultimamente… Quando não está todo amassado por desempenhar a função saco de pancada, a cápsula continua molhada da chuva do dia anterior e ele pode estar fora do lugar ou de especificação… Sem contar que, artisticamente falando, ele também é o primeiro que ouve…

Também considero um dos itens “técnicos” importantíssimos dessa conversa, os profissionais das empresas terem tido uma bela noite de sono e um chuveiro quente, depois do show do dia anterior e deixado os cases das mesas para a proteção e segurança das mesmas… Não da pra pedir nada pra quem dormiu a noite toda numa tampa de console e coberto com lona amarela!!!…

A qualidade das empresas de locação, seus investimentos e equipamentos de ponta tornaram nossa vida on stage muito mais fácil, e nosso tempo útil pode e deve ser direcionado para uma exaustiva busca da informação e da concepção adequada ao trabalho… Por favor, não transforme um projeto vitorioso de milhões de dólares em uma aberração sonora com uma “curva” de EQ tão equivocada quanto cinematográfica!!! … (Ah, também tem aquela do processador bloqueado por “segurança” [????!!!!] e o responsável que tem a senha estar fora de qualquer possibilidade de contato…hahahahahaha).

Checar transmissão e recepção, alinhar e zerar entradas e saídas, conferir energia, monitores, in-ears, microfones, cabos, dar aquela repassada na sua cena da mesa, bater um bom papo com a galera do evento sobre os resultados do dia anterior de trabalho, etc é uma tarefa extremamente agradável e produtiva… Juro que é!!!

Em tempos de muita gente falando na “primeira pessoa”, gostaria de esquecer essa parte desinteressante e pouco produtiva de seguidores e usuários do “eu fiz”, “eu faço”, etc e fazer um brinde ao conceito “todos pelo resultado final”, ao básico e a informação total!!!… Só o básico… O som agradece, o mercado agradece… A melhor maneira de definir o conceito “o melhor”…

Abraço do Farat!!!